terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

A problematização da sexualidade



A Igreja Católica problematizou a sexualidade ao final da Idade Média, afirma Michel Foucault em História da Sexualidade. A minha tese é que houve também uma problematização do amor. O imaginário que hoje cerca esse sentimento possui associações e projeções que se originaram na Igreja num momento passível de ser identificado e acompanhado.

Vou explicar Foucault para depois retornar a minha tese.

Segundo Foucault, a partir do século XII e XIII, a penitência tornou-se um sacramento. Até então, a Igreja exercia um controle muito frouxo sobre a sexualidade e a penitência era um caminho para a remissão dos pecados, mas de escolha do próprio pecador, uma espécie de autoflagelação: uso de cilício, interdição dos cuidados de limpeza, jejuns rigorosos, castidade...


A reforma nos dogmas e procedimentos da Igreja, torna o padre o responsável por intermediar a absolvição junto a Deus. É ele quem irá prescrever a punição conforme o pecado, e para conhecê-lo será preciso extrair a confissão do fiel.

A confissão, que antes era um ato voluntário e realizado em cerimônias coletivas, torna-se obrigatória para todo cristão e de caráter individual, regular e feita em ambientes reserv ados, diante da figura do padre. Os manuais eclesiásticos descrevem técnicas para extrair o máximo de detalhes sobre a intimidade, desejos e fantasias sexuais dos fiéis. Aos poucos a confissão torna-se a própria penitência:

“(...) Ela é um sacrifício, porque provoca a humilhação e faz enrubescer. Ela provoca a erubescentia. O penitente enrubesce quando fala e, por causa disso, ‘dá a Deus – diz Alcuíno – uma justa razão para perdoá-lo’”( Os Anormais, Martins Fontes, 2001: 219).

Esse é o momento em que a sexualidade para Foucault passa a ser problematizada. O desejo sexual é em si um pecado, que precisa ser vigiado, controlado e disciplinado. A confissão é uma técnica para disciplinar o desejo sexual, que tem início com a Igreja Católica e que se desenvolve na, pedagogia, na psicanálise e na medicina. Somos a única civilização, na opinião de Foucault, que produziu profissionais especializados em ouvir confidências sexuais.


Em História da Sexualidade, Foucault pergunta por que “de repente” um ato tão banal e comum como a masturbação do adolescente se tornou um problema fundamental a ser investigado pela pedagogia e a medicina? Livros e livros foram produzidos para descrever as complicações advindas: doenças, vícios, crimes, etc.


“Dessa forma, ele se tornou, progressivamente, o objeto de grande suspeita; o sentido geral e inquietante que, independente de nós mesmos, percorre nossas condutas e nossas existências; o ponto frágil através do qual nos chegam às ameaças do mal; o fragmento de noite que cada qual traz consigo” (História da Sexualidade – a vontade de saber, 2006:79).

E sobre a problematização do amor? Falarei no próximo post

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