quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O amor e o cotidiano



A possibilidade da felicidade é um fato recente na história humana. Não disse que o homem da Idade Média não desejasse a felicidade. Desejava. Não acreditava é que ela fosse durar, que pudesse fazer parte do cotidiano. Só na modernidade, o homem interpreta a felicidade como passível de ser obtida por sua ação e não por obra do acaso, a existência humana deixa de ser naturalmente limitada e infeliz. Em Platão, nos epicuristas, em Maquiavel, Santo Agostinho, São Tomás de Aquino e em outros autores medievais, vamos ouvi-los falar sobre a finitude e relatividade da vida, e o efêmero das paixões humanas. Deus, os santos e os anjos são imutáveis e eternos. No mundo humano, tais qualidades são impossíveis. Por isso, a paixão é rara e desvalorizada. Diria mesmo que ela está associada à doença mental. O homem não acredita num sentimento eterno e imutável, quando a morte assombra com pestes e doenças incuráveis, e a vida mostra-se tão breve. Foi necessário valorizar o cotidiano para inventarmos o amor atual: o amor bem-comportado, em que desejamos casar, ter filhos, viagens nas férias, compras de supermercados nos finais de semana, aposentadoria e uma felicidade branda e contínua. Foi preciso um mínimo de planejamento e previsibilidade para investirmos num sentimento e desejar sua estabilidade. Até então, amor era prazer e como prazer fugaz.

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