
Observou que nem todos os indivíduos possuem um
comportamento adequado com os padrões sociais. Verificou mesmo que a maioria,
em algum momento da vida, acaba cometendo algum tipo de desvio. Se tivesse lido
Howard Becker, concordaria com o autor que os desvios são mesmo muito comuns.
Um dos desvios que o motivou a inúmeros textos foi o adultério. O casamento,
para ele, era uma instituição que não funcionava. As mulheres nem sempre
participavam da escolha de seus futuros maridos, atendiam as preferências das famílias.
Sentiam-se obrigadas a casar e apressavam a união com quem não tinham
afinidade. Com o tempo, o casamento tornava-se um martírio, uma rotina sem fim,
até o momento em que a mulher encontrava um grande amor.
Quando fala em amor, Nelson Rodrigues é
sociólogo mais que escritor de literatura. Seu conceito de amor não faz
referência ao jargão comum do que se entende por esse sentimento desde os
românticos: amor para o todo sempre, indivisível, com casamento e filhos. O
amor é um sentimento anti-social. O amor, para ele, é a identidade entre duas
pessoas, vivida de maneira tão forte e extrema, que a sociedade deixa de ser
importante e o casal rompe com todo vínculo social. Quando isso acontece, a
conseqüência possível é o crime, o
suicídio, o assassinato...
A díade busca a sua sobrevivência, não a realização da
sociedade. Qualquer pessoa que tenha um dia vivido um grande amor experimentou
esse sentimento de desprendimento, do tempo correndo num ritmo diferente, de
não se importar com a opinião dos amigos e familiares, de satisfação plena em
simplesmente estar ao lado do outro. Por isso, as histórias de amor nos contos
de Nelson Rodrigues terminam quase sempre em tragédia, não possuem como
objetivo funcionar no mundo. Pelo contrário, as díades são pequenas sociedades
de dois indivíduos que se satisfazem plenamente dentro da sociedade maior.
Possuem um fechamento em relação à sociedade. Não são comuns e se fossem, simplesmente,
causariam um caos social.
É por essa razão, que
Nelson Rodrigues diz que quem amou e não desejou a morte, nunca amou. Porque, para ele, o amor no seu extremo leva a um rompimento tão radical com a
sociedade, cuja conclusão pode ser o suicídio.Um dos temas repetidos nas crônicas de Nelson Rodrigues é a história
de jovens amantes que planejam a morte juntos. Ou então, fugir do mundo. Não me
esqueço dos personagens Engraçadinha e Luís Cláudio que ponderam se não seria
mais simples fugir: “Vamos fugir” diz Luís Cláudio para Engraçadinha. “É tão simples fugir!”, argumenta.
Porque o amor é um sentimento anti-social, nas histórias de
Nelson Rodrigues, nunca evolui para o
casamento. Quase sempre se desdobra em tragédias, dificilmente, num casamento
com véu e grinalda. Amor para ele não é o equivalente a “viveu feliz para
sempre”, ou “tiveram muitos filhos” e “compraram uma casa”. Para ele, amor é desejo.
Esse é o verdadeiro sentimento que une um homem e uma mulher, resultado de uma
identidade intensa. O desejo arrasta os indivíduos para situações de conflito e
rompimento com as normas sociais. É o que não estava no script, mas também é o
espaço de transformação social e individual.