domingo, 10 de janeiro de 2010
O amor como doença
Difícil acreditar que em algum momento tenhamos comparado o amor-paixão a uma doença, chegando mesmo a prescrever remédios. Mas isso aconteceu. Em textos de confessores dos séculos XVII e XVIII, o amor é uma doença relacionada ao pecado e o casamento uma espécie de remédio para a alma.
As paixões são enfermidades do espírito refletidas no corpo: febres, infecções, tristezas, melancolias, pulsações alteradas, tísicas, lepra, loucura, etc. Francisco de Mello Franco, em Medicina Theologica ou Súplica Humilde, diz claramente “Não se pode excetuar do catálogo das enfermidades o amor" (1794: 38). Para ele, as principais vítimas são aqueles de temperamento dócil, as moças, os celibatários, os jovens rapazes, os de educação branda e os ociosos.
"Este amor geral quando se aplica com força a seu objeto, é na verdade grande doença, que produz não só a loucura, mas também uma infinidade de males que os físicos, e moralistas têm conspirado numerar, e não tem podido. Produz o amor a loucura, porque originando-se esta da decomposição das fibras nervosas, que entram na textura do cérebro, e esta decomposição provindo da ____ atenção, que se dá a qualquer coisa, vem a ser certo que o amor causa esta loucura; porque ele é o que fixa o pensamento sobre o objeto amado, decompõe a fábrica interior do cérebro, levanta o tumulto nos fluidos nervosos, e desordena a conexão das idéias sobre o que se ocupa" (idem:40).
Se as doenças originam-se da alma, dos excessos que as paixões causam ao espírito, o melhor tratamento é a punição. Os confessores são médicos da alma, que prescrevem não apenas orações, jejuns e preces, mas também remédios amargos e azedos para os que se entregam aos pecados da carne. Os próprios remédios são punições. Não atuam sobre a fisiologia do corpo, visam corrigir os doentes de suas condutas, zelar para que disciplinem suas atitudes e paixões.
Nesse sentido, o casamento também é uma forma de remédio que deve ser prescrito para o caso das “moças histéricas”. A razão do casamento não é o amor. Não é a transmissão de herança. Não se faz por títulos de nobreza. Todas essas razões podem estar incluídas, mas uma nova função foi acrescida ao casamento: ser remédio para aqueles que não conseguem controlar suas pulsões sexuais.
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